Investigadores da Universidade dos Açores estão a desenvolver várias linhas de trabalho no âmbito da doença de Machado-Joseph, com alta taxa de incidência na região, apostando actualmente na caracterização ao nível molecular das alterações que ocorrem naquela patologia, avança a agência Lusa.
“Estamos a caracterizar ao nível da célula as alterações que ocorrem nesta doença. A ideia é que se possa, antes do individuo ter sintomas, na altura que for descoberto um fármaco, começar a dar este medicamento ao doente, logo que as alterações moleculares se começarem a manifestar”, explicou à Lusa Manuela Lima, investigadora da Universidade dos Açores.
A especialista em Genética Humana proferiu esta quinta-feira uma palestra na sede da Associação Amigos da Ilha das Flores, em Ponta Delgada, no âmbito do Dia Mundial das Doenças Raras, e onde deu a conhecer também uma tese de mestrado de Conceição Araújo, que integra o grupo da Universidade dos Açores que investiga a doença de Machado-Joseph, que foi pela primeira vez identificada em descendentes de açorianos na América do Norte.
A especialista explicou que actualmente uma pessoa filha de um doente Machado-Joseph pode mesmo antes de ter sintomas da doença dirigir-se ao hospital e pedir para fazer um teste genético.
Dados de 2011 referem que existem nos Açores 99 doentes com Machado-Joseph distribuídos maioritariamente por S. Miguel (53) e pelas Flores (26), com uma média de idades que ronda os 40 anos, mas existem também doentes na Terceira, Faial, Graciosa ou Pico.
Manuela Lima disse estar confiante, a longo prazo, num fármaco que possa ser ministrado como modo de retardar o aparecimento da doença e destacou a tese de mestrado de Conceição Araújo, “um trabalho muito importante que chama a atenção de uma situação real e de necessidades reais”.
No caso da ilha das Flores, onde existe a mais alta taxa de incidência no mundo, considerou há a necessidade de “uma intervenção muito particular” junto dos doentes e seus familiares, alegando que estes têm que se deslocar a outra ilha, nomeadamente S. Miguel, para “um acompanhamento mais regular” por parte da componente de neurologia e de psicologia.
A Machado-Joseph condiciona a coordenação dos movimentos, desde a fala e gestos das mãos ao equilíbrio e marcha, embora dependa de caso para caso.
A especialista destacou que os Açores criaram legislação própria que permite ajudar estas famílias, a par do trabalho da Associação Atlântica de Apoio ao Doente de Machado-Joseph.
“O facto de haver uma equipa que há muitos anos está ligada a esta doença acaba por disponibilizar um conjunto de recursos que pode ser usado para quem quer decidir questões sobre saúde”, frisou, destacando o trabalho multidisciplinar envolvendo biólogos, neurologistas, especialistas em psicologia e geneticistas.
A Universidade dos Açores colabora no programa de aconselhamento genético que existe na região e que permite disponibilizar um teste genético aos doentes e famílias.
Manuela Lima destacou que desde 2011 existem vários trabalhos do ponto de vista experimental em modelos animais e “acumulou-se algum conhecimento sobre o mecanismo da doença” e “bom potencial”, incluindo de vários grupos a nível nacional.
A investigadora admitiu que não tenha havido propriamente um aumento da doença nos Açores, mas considerou existir “alguma tendência para se ter mais casos” porque existe um melhor conhecimento sobre a patologia.